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IDADISMO/2025

A crônica é eterna. enquanto dura, como era o amor para Vinícius. 

O título datado (2025) é na esperança que, no futuro,  nos leiam, para saber como eram nossos tempos, o passado em Porto Alegre.

Estou com 72 anos. Dizem que aparento menos, mas sou um velho. Velho com direitos, diz a Constituição. Um cidadão que exige respeito, em especial quando é consumidor.

Cuido da minha mãe. Ela é nonagenária. Precisa de fraldas geriátricas. Como neste país tem SUS, e funciona, tem Farmácia Popular, e funciona, ela recebe sua cota mensal, sem pagar um tostão.

Mas a enfermeira pediu que trouxesse absorventes geriátricos também, estes são pagos.

Fui atendido pelo farmacêutico da rede. Ao pedir os absorventes, dizendo que pagaria à parte, era para a mesma pessoa, a quem ele tinha já passado as “fraldas geriátricas”, andou de um canto a outro catando o produto, quando uma atendente mostrou o local. 

Peguei o pacote, cheguei na Geriatria, os absorventes não eram “geriátricos”. Lá fui eu tentar trocar, e a atendente me pergunta “quem lhe atendeu”, falo o farmacêutico, eis que o tal escuta e pergunta: por quê? Expliquei que tinha solicitado a ele, negou, mostrei que ele não dera atenção à minha fala e disse grosseiramente “não vou discutir com o SENHOR”. Marcou a referência a mim.

Talvez alguém possa pensar que é apenas um mal educado. Sim, já tinha ouvido queixas dele de outra pessoa. Mal educado, sem dúvida, mas como estou no Movimento Sociedade Sem Idadismo, uma entidade, associação que trata da luta contra todos os preconceitos de idade, sejam contra jovens quanto de velhos, entendi o recado do tal farmacêutico. Tem clara gerontofobia.

Porto Alegre ainda é tida como uma cidade moderna e civilizada. Já foi bem mais. Chegou a ter a sua Belle Époque, confundindo-se alguns traços com Paris. Hoje é suja, como se queixava Saint Hilaire, fede, ruas mal sinalizadas, calçadas intransitáveis. É uma cidade hostil ao povo, aos velhos de modo especial.

E me parece cada vez mais uma cidade do “Porto Alegre do tchau”. Em uma década perdeu quase 80 mil moradores. Tem 101 mil unidades de moradia, comércio e serviços fechados.

Tudo aqui “aluga-se”, “vende-se” ou simplesmente nada consta.

Os jovens estão tendo empregos em Santa Catarina, os que podem vão ao Salgado Filho para voar para bem longe, a Austrália.

Os velhos que têm pouco ficam por Cidreira, os endinheirados toscos vão para os condomínios de Xangri-lá, os mais descolados vão a Torres. E quem pode e quer mais paz e saúde vai para alguma praia catarinense.

Para manter minha saúde mental, para mostrar aos leitores do presente que não se deve calar jamais, aos que me lerão no futuro, acreditem: era assim em 2025.


Adeli Sell é professor, escritor e bacharel em Direito.

1 comentário em “IDADISMO/2025”

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