Filhos devem cuidar dos pais?

Tenho lido, ouvido e visto que filhos devem cuidar dos pais, que não passa de obrigação, pois foram cuidados por eles desde que nasceram e atingiram a vida adulta. Essa tem sido, ao meu ver, uma das maiores falácias do século XXI.

Quem pode, pode. E quem não pode, se sacode? Lembrando que mais de 80% da população brasileira possui baixo nível de renda, o que impossibilita os cuidados por meio de profissionais, os cuidadores.

O tema é complexo, mas não pode ser reduzido a um simplismo de obrigação dos filhos. Em uma sociedade que envelhece a passos largos e que, por outro lado, precariza as formas de sustento dos adultos que, em tese, estariam aptos ao cuidado dos pais, a defesa desse conceito não passa de uma forma da própria sociedade se esquivar da responsabilidade que tem: eleger governantes e legisladores que criem – e, principalmente, implementem – leis e políticas públicas voltadas ao cuidado das pessoas idosas.

Outra distorção que temos na sociedade é sempre “jogar a culpa” nos governos, esquecendo que governos são eleitos pela sociedade, pelas próprias pessoas que, no mais das vezes, necessitam de cuidado ou que precarizam esse cuidado. Dito de outra forma, a questão dos cuidados das pessoas idosas não é uma questão de governo ou de legislação, é da própria sociedade. E aí se torna fácil dizer que a responsabilidade é dos filhos ou de familiares.

Ou assumimos que em uma sociedade que envelhece a responsabilidade é a da própria sociedade e passamos a escolher políticos que efetivamente compreendam as reais necessidades da população carente de recursos para cuidar das pessoas idosas, ou seguiremos em algo que parece ser o DNA do brasileiro: jogar a culpa nos outros. E a responsabilidade também.

Políticas públicas são pensadas e implantadas por políticos que pensam no público e não apenas no próprio umbigo ou no umbigo do poder econômico. Infelizmente, o brasileiro não tem consciência de ser uma sociedade. Historicamente fomos formados a pensar e ser individualistas. Cada um por si. Quem pode, pode!

Ou fazemos uma revolução, cultural que seja, ou estamos fadados não apenas a ser uma sociedade “velha”, mas, pior ainda, uma sociedade que verá seus “velhos” atirados nas ruas ou em ILPIs sem as mínimas condições de abrigar com a dignidade que seres humanos possuem.

Precisamos investir na juventude, para que saiba o destino que lhes espera. Não o de ter que cuidar dos pais, mas o da marquise!