
Eles começaram muito antes da febre de “mães” por bebês que imitam com perfeição crianças recém-nascidas Mas não vim aqui falar sobre a nova tendência muito falada na internet sobre bebês que são idênticos às crianças, que já nascem de partos quase reais, com cordão umbilical, que usam fraldas, tomam mamadeira, têm febre, são perfeitos, aliás quase prefeitos pois necessitam de pilhas para chorar, respirar e bater o coração.
Na minha infância o sonho de consumo era ter um Glu-Glu. Ele era um boneco de plástico, que vinha com uma mamadeira, ingeria líquidos e depois fazia xixi num buraquinho que não lembrava em nada genitálias.

Depois a febre foi as bonecas Barbie, que passou de bonecos bebê para bonecas femininas, vestidas com glamour, e roupas da moda, começou com bonecas loiras, depois veio a miscigenação, bonecas de diferentes nacionalidades e etnias, por fim vieram barbies gordinhas, grávidas, esportistas, profissionais, tudo muito real para as meninas brincarem, embora algumas adolescentes ainda guardassem suas Barbies como um hobby, haja visto o fenômeno de bilheteria do filme Barbie com diversificados públicos e faixas etárias.

Até este período tudo tranquilo.. Mas não contentes com as vendas e o sucesso dos objetos inanimados nas brincadeiras infantis, alguém teve a ideia de voltar a produzir bonecos com características de bebê, mas desta vez muito mais realista: Os Bebês Reborn, para meninas brincarem de mamãe. Eu falei meninas! Eram bem valorizados e poucas crianças tinham seu bebê Reborn, perfeitos como já falei, e que deixavam suas vovós (as mães das meninas) orgulhosas nos passeios com sua nova família, indicativo de status e cuidados mais atentos da menina com seu brinquedo.
O objeto desta reflexão psicológica é até onde poderá ir o delírio coletivo, ou melhor, denominando o preenchimento de espaços vazios na vida das pessoas solitárias, carentes, e que não conseguem conviver com a realidade cotidiana, numa negação absurda de um mundo real que optam pelo mundo da fantasia.
Paralelo ou pouco antes do fenômeno bebê Reborn, já observávamos a humanização de animais, cães, gatos e outros animais domésticos sendo tratados como filhos, indo para creche no horário de trabalho dos tutores, escolinha de adestramento, roupinhas, brinquedos, passeios em carrinhos de bebês, festas de aniversário, guarda compartilhada em caso de separação dos tutores. Tudo dentro de parâmetros da normalidade, até certo ponto, afinal são seres vivos passíveis de direitos e cuidados, embora sua humanização tenha se tornado algo exagerado.


E a pergunta é: A serviço de qual intenção, consciente ou inconsciente? Crianças dão muito trabalho, choram, tem cólicas nos primeiros meses de idade, precisam de carinho atenção, tiram a individualidade dos pais, na medida em que vão crescendo têm suas exigências e buscam sua liberdade, não sem antes privarem seus pais de horas de sono e sossego. E quando se vão deixam um ninho vazio difícil de preencher. Animais que nem são chamados mais assim, agora são “pets”, bichos de estimação, adoecem dão um relativo trabalho, mas nos amam incondicionalmente, não respondem não nos afrontam, dão menos gastos e maior liberdade, só têm um grande problema duram menos tempo do que gostaríamos, para isto há algumas soluções; se tiverem raça definida após passar a dor da perda, adota-se outro com iguais características, se for sem raça definida, o querido vira latas, se adota outro, são tantos…
Os bebês Reborn, não; eles não crescem, não brigam, não dão despesas com escolinha, não exigem, não vão embora, não morrem (!?) São eternos, e aí está o grande paradoxo; eles são pretensamente amados, cuidados, trazem atenção a suas mamães, mulheres solitárias ou não, que tiveram filhos ou não, jovens ou com mais idade. São seres inanimados que dão a elas a falsa segurança que serão eternos e depositários de seu afeto por toda a vida.

Delírio total, cabível em classificação do DSM Diagnostic and Statitstical Manual of Mental Disorders (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) como Esquizofrenia, Histeria Dissociativa ou Delírios Psicóticos, todos transtornos que comprometem o contato com a realidade. No caso de Alzheimer é comum vermos vovozinhas com suas bonecas no colo e cuidando-as como se bebês fossem caracterizando a fuga da realidade num tempo passado.
A intenção desse artigo é orientar e desmitificar o que aparentemente parece uma brincadeira inocente, pois a neurociência comprova que quanto mais nos afastamos da realidade concreta, mais o cérebro ativa áreas ligadas à dissociação, delírios e transtornos. Pois a linha entre a fantasia e realidade some causando por vezes, distúrbios de difícil reorganização mental.
Portanto, esta reflexão não é mais sobre um boneco, é sobre o vazio existencial, o buraco emocional que certas pessoas carregam e não conseguem mais conviver sozinhas, então buscam formas de refúgios que não as levem a sofrer com o ciclo vital, apenas existindo para sempre e além de todo o delírio, recebendo aplausos nas redes sociais numa possível manifestação de histeria coletiva.