OS IPÊS FLORIDOS

Olhem para os ipês floridos na Praça da Matriz, em Porto Alegre. É Primavera.
Eles não se despediram do Inverno.
Eles se transmutaram. É a Metamorfose das suas vidas. Continuam sendo ipês, porque são ipês.
Assim, também são os jacarandás, da Praça da Alfândega, cheia de livros da Feira a cada ano.
“DESPEDIDA” – PALAVRA TORTA
Uma palavra que me incomoda demais é “despedida’. Porque ela não vai ao ponto.
Quando meu pai morreu, fiz os meus 500 km de distância mais difíceis da vida. Não voltei para a Cunha Porã/SC, onde com ele convivi até meus 18 anos, para me despedir. Fui para cumpri um rito de passagem.
Na homenagem a ele, falei do exemplo de vida que me deu. Meu caráter foi forjado pelos seus afetos, ensinamentos e ações. Para mim ele continuará sendo o Seu Alberto, ícone de ética (que sigo).
Seu corpo jaz naquele cemitério, mas dele e do que foi jamais me afastei.
Com a morte de minha mãe, de quem fiquei longe por 45 anos, me voltou a martelar na cabeça a palavra inadequada: “despedida”. Pude cuidar e dela e dar carinho nos seus últimos anos. Ao me afastar do leito dela no Postão (Posto de Atendimento Médico), imaginei que pudesse ser a última visão dela. E foi.
Não estava com ela no dia do seu fim. Estava distante, mas ali estava minha irmã, como combinamos. Lidar com a Finitude é essencial. A gente tem o luto. Com sentimentos de tristeza, vazio, dor e saudades.
Com suas cinzas no mesmo túmulo de meu pai, era seu pedido, me lembrarei dela pela força das lutas de sua vida. Nada do que foi vai desaparecer do meu âmago.
Portanto, não há despedidas. Para mim, a palavra “despedida” está riscada do dicionário da vida.
AFETOS E EMOÇÕES
Para compreender o que são afetos e emoções partimos das reflexões de Spinoza e de Sara Ahmed.
Spinoza nos ensina que os afetos são os modos pelos quais a vida se movimenta. Quando aumentam nossa potência de agir, de sentir e de compreender o mundo de múltiplas formas são chamados de afetos alegres. Dos meus, pais e avós, trago estes afetos (alegres). Eles me empurrem para frente. Fazem com que eu viva momentos de plenitude.
Ahmed, por sua vez, mostra que as emoções são também forças sociais: circulam, colam em corpos, constroem fronteiras e hierarquias. Sim, os afetos dos meus colaram em mim.
ADELI SELL é professor, escritor e bacharel em Direito.